quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

Pioneira da arqueologia busca restos do homem pré-histórico no Brasil

Pioneira da arqueologia busca restos do homem pré-histórico no Brasil

Maria Beltrão retomou projeto de escavação iniciado em 1982 na Bahia e diz que objetivo é achar crânio ou parte do esqueleto do homem fóssil. Para pesquisadora, falta consciência sobre sítios arqueológicos no Brasil.

Maria Beltrão é considerada uma das pioneiras da arqueologia no Brasil
Após sete anos esperando por uma autorização do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Maria Beltrão – tida como pioneira da Arqueologia no Brasil – finalmente voltou a escavar na Toca da Esperança. O local, próximo ao município de Central, na Bahia, é considerado o sítio arqueológico mais antigo da América.
Nesta segunda-feira (12/05), Beltrão, que completa 80 anos em 2014, e sua equipe retomaram o projeto de escavações iniciado em 1982. Os pesquisadores pretendem ficar 20 dias na região, seguindo uma rotina de sete horas de trabalho. Segundo a pesquisadora, a maior dificuldade será o clima quase desértico da caatinga.
A ocupação humana da Toca da Esperança foi estimada em cerca de 300 mil anos. Mas como o método utilizado para a estimativa permite um limite de no máximo 300 mil anos, Beltrão acredita que a presença humana no local possa ser muito mais antiga.
Beltrão trabalha com arqueologia há 55 anos. Nascida em Macaé, no Rio de Janeiro, a arqueóloga estudou no Brasil e na França, onde também realizou pesquisa de campo em sítios arqueológicos.
Em entrevista à DW Brasil, a pesquisadora falou sobre o que espera encontrar na Toca da Esperança e sobre os sítios arqueológicos brasileiros.
DW Brasil: Quais são as expectativas para essa nova escavação?
Maria Beltrão: A minha expectativa agora é uma só: achar o crânio ou parte do esqueleto do homem fóssil [na arqueologia, o oposto do homem vivo].
O que já foi encontrado nesse sítio arqueológico?
A coisa mais importante foi um chopper, o instrumento mais antigo da humanidade [ferramenta utilizada para cortar e amassar alimentos]. Os choppers mais antigos cabem na palma da mão, e esse é o caso do que foi encontrado na Toca da Esperança. Ele é compatível ao Homo habilis, a espécie do gênero Homo mais antiga. Mas talvez tenha uma possibilidade de ter sido compatível ao Homo erectus. Eu chamo o Homo erectus de o grande viajante, porque ele ocupou quase todo o mundo, exceto, como dizem, a América. Mas eu discordo.
Discorda por quê?
Há um sítio no estado do Rio de Janeiro que se situa na depressão calcária de São José do Itaboraí. Eu o julgo importantíssimo porque tem a sequência dos artefatos que correspondem a todas as espécies de Homo, desde a base até a superfície. Na base tem o chopper, depois os bifaces, o machado de mão, os grandes raspadores e vai especializando cada vez mais, até chegar ao buril [instrumento utilizado para gravura]. Ou seja, é um sítio que pode ter entre 11 mil e 2 milhões de anos. Agora eu não sei se vou estar viva para achar o homem fóssil, mas acredito que ele possa ser achado com mais facilidade na Toca da Esperança, porque é um lugar fechado, uma gruta. E Itaboraí é uma vastidão, tudo aberto, um sítio enorme, com 600 metros de extensão e 70 metros de profundidade.
Como está a situação do sítio Toca da Esperança?
O sítio é uma bocarra de uma gruta de 80 metros por 80 metros. A região só é frequentada por caçadores, e até hoje não houve nenhum vandalismo.
E como está a situação geral dos sítios arqueológicos no Brasil?
Há muita destruição, não por causa do governo ou dos arqueólogos, mas porque as pessoas não sabem o valor e nem reconhecem um sítio arqueológico. Mas, desde que comecei até agora, melhorou muito. Eu costumo dizer que o Brasil é um grande sítio arqueológico, porque tem muito sítios arqueológicos, dependendo da profundidade que se escavar.
Ocorreram muitas mudanças na arqueologia brasileira desde que a senhora iniciou seu trabalho, em 1959?
Mudou bastante a consciência. Hoje, em cada universidade, em cada instituto de ciências humanas, há um arqueólogo. Mas a minha meta – ou o meu sonho – é ver um arqueólogo em cada prefeitura, porque a autoridade mais próxima do sítio arqueológico não é federal ou estadual, mas sim municipal.

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