Até 15% dos gays têm HIV
Até 15% dos gays têm HIV, e O Globo
culpa quem? O “preconceito”! A “ondaconservadora e homofóbica”
É mais uma blindagem de responsabilidade! Mais uma transferência
Até 15% dos gays têm HIV, e O Globo
culpa quem? O “preconceito”! A “ondaconservadora e homofóbica”
É mais uma blindagem de responsabilidade! Mais uma transferência
Não sei se sou eu que andava lendo menos O Globo, ou se hoje a capa do jornal está acima da média em – como direi? – blindagem de responsabilidades. No post anterior, falei da manchete que blinda o secretário de Segurança Pública do Rio de Janeiro, José Mariano Beltrame. Mas logo abaixo dela, há uma chamada igualmente “estarrecedora”, como diria a presidente Dilma Rousseff, certamente não neste caso dos gays. Veja:
Você leu direito: “preconceito faz dos gays mais expostos”. Didi Mocó diria: “Cuma!?” O preconceito – por pior e mais repugnante que seja – transmite vírus da Aids agora? Será que ele vai para a cama com os gays? Será assim uma relação carnal forçada, um estupro anal sobre o qual boa parte das “vítimas” gays não tem responsabilidade alguma? Essas perguntas passam pela cabeça de seres letrados, héteros ou gays, que leem uma manchete de cunho ideológico como esta na capa de um jornal, passando-se por dado informativo. E parece piada macabra, mas a manchete lá dentro não faz por menos:
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Os “especialistas” ouvidos pelo Globo, claro, “são unânimes em afirmar: o preconceito e a discriminação são os maiores responsáveis por essa situação. A recente onda conservadora e homofóbica só faz agravar o problema”. Sem brincadeira. É o que está escrito lá no texto, que saiu também no site do Extra, com um título menos escrachado que “Discriminação incurável”: “Aids: 30 anos depois do início da epidemia, gays continuam sendo os mais vulneráveis“. A necessidade de associar o conservadorismo à homofobia é proporcional à de eximir-se de explicar os motivos. Mas nem precisa: a gente sabe que ser contra o “casamento gay”, como até uns tantos gays são, já constitui homofobia para a imprensa brasileira.
Uma das declarações que levaram às sínteses forçadas da capa e do título foi a da diretora do Programa de Aids das Nações Unidas (Unaids) no Brasil, Georgiana Braga-Orillard:
“O Brasil tem uma resposta muito boa no que diz respeito aos medicamentos disponíveis, mas a discriminação das populações mais vulneráveis continua sendo um desafio. Muitas pessoas morrem sem sequer saber que têm a doença. Elas têm medo de fazer o teste, de perder a família, os amigos, o emprego… E acabam chegando muito tarde ao tratamento. Em Curitiba, 20% dos diagnósticos são feitos depois do óbito, para você ter uma ideia.”
Alto lá! Daí a dizer, como a capa do Globo, que o “preconceito faz dos gays mais expostos” ou, como a matéria, “o preconceito e a discriminação são os maiores responsáveis por essa situação”, vai uma distância imensa. É duro ter de repetir o óbvio, mas vamos lá:
1) Muito antes do teste e do medo do “preconceito” na hora de fazê-lo, há a contaminação com o vírus. E de acordo com os Centros de Controle de Doenças, dos Estados Unidos, cujo relatório eu resumi aqui dois meses antes do Globo, “A maioria dos homens homossexuais e bissexuais adquirem o HIV através do sexo anal”. Preciso explicar que o preconceito não faz ninguém praticar sexo anal com ninguém? Espero que não! Transar, exceto em casos de estupro, é sempre uma escolha – que envolve riscos, especialmente neste caso.
2) Uma das verdadeiras razões para a maior incidência de infecção entre os gays é a promiscuidade,segundo os mesmos Centros de Controle de Doenças ignorados pelo Globo: “Ter mais parceiros sexuais em comparação com outros homens significa que homens homossexuais e bissexuais têm mais oportunidades de ter relações sexuais com alguém que possa transmitir o HIV ou outra doença sexualmente transmissível. Da mesma forma, entre os homens homossexuais, os que têm mais parceiros são mais propensos a adquirir o HIV.” Nos EUA, os homens gays são apenas 2% da população, mas 52% das pessoas com HIV. “Gays” no sentido genérico, que abrange homossexuais, bissexuais e outros homens que fazem sexo com homens (HSH). O mesmo sentido usado pelo Globo.
3) Nem todas as pessoas que morrem sem saber que tinham a doença são pessoas que tinham medo de fazer o teste por conta do “preconceito”. Parte delas morre precocemente porque não se preocupa mesmo em verificar se está doente, como a própria matéria sugere adiante: “as gerações mais novas entenderam, porém, é que a Aids ‘deixou de ser um problema’”. Outra parte dos que morrem não faz testes por conta de outros medos – como de hospital, de médico, de se saber doentes de qualquer coisa etc. – que nada têm a ver com “preconceito” nos meios sociais.
4) Se alguém deixa de fazer o teste por medo de um “preconceito”, sinto dizer, mas não é dos supostos preconceituosos nem do suposto preconceito a responsabilidade pela sua morte precoce, mas da pessoa que não os enfrenta e se deixa morrer doente. Salvo algum caso especialmente louco, e apesar de eventuais problemas de acesso aos postos de saúde, ninguém impede fisicamente os gays de fazer os testes. Transferir a responsabilidade dos gays pelo cuidado com a própria saúde para a sociedade inteira é fazê-los de vítimas inescapáveis de seus próprios medos, em ALGUNS casos inevitavelmente exagerados por uma histeria em sentido clínico. Histeria esta também insuflada pelas mentiras da imprensa sobre os números de assassinatos homofóbicos, como se todos os gays assassinados – poucas centenas em um país de quase 60 mil homicídios por ano – fossem vítimas de ‘crime de ódio’ e boa parte não fosse morta pelos próprios parceiros gays, como as estatísticas constatam.
Pois bem. A matéria do Globo é costurada pela história do estudante evangélico Max Goudar, de 24 anos, que acredita ter pego o vírus de um namorado. Max alega falta de informação na época da contaminação; os “especialistas” dizem que, “de fato, o conhecimento básico sobre a infecção e suas formas de prevenção não tem chegado às gerações mais jovens”; e aí vem um depoimento do ator Mateus Solano de que “a falta de informação leva ao preconceito”, o que nada tem a ver, na verdade, com a falta de informação de Max, mas com o preconceito dos outros. A confusão faz parecer, mais uma vez, que é tudo culpa do preconceito geral da sociedade.
Mas comento: nenhuma dose de informação sobre a Aids será jamais suficiente para suprir a dose de irresponsabilidade individual e sexual disseminada em uma cultura, inclusive por reportagens como esta, que se querem também informativas. Uganda — o país onde o número de soropositivos diminuiu graças à política de incentivo à castidade e à fidelidade conjugal — já mostrou que o buraco é muito mais em cima, mas o Brasil prefere distribuir camisinhas, pílulas e fazer propaganda gay nas escolas, banalizando o ato sexual. Adiante.
Max teria ouvido a frase “O preço do pecado é a morte” quando soube que era portador do HIV. Esta frase é a primeira da matéria. Sempre que se quer dar a conservadores, direitistas e/ou cristãos ares de radicalismo, a imprensa pinça uma frase radical qualquer, sem autor determinado, ou de autor suspeito. Foi assim nos protestos anti-PT com a “intervenção militar”. Foi assim no artigo de Helena Celestino após Israel SOFRER um ataque terrorista: “’Morte aos árabes’. Este era o grito de guerra dos ultradireitistas em Israel”, dizia ela na primeira frase. Foi assim agora na matéria sobre a Aids.
Max, no entanto, “teve grande apoio da mãe, em particular, e da família, em geral, o que nem sempre ocorre” e resolveu ao menos tratar a doença. Mas e se a “família em geral” não desse o apoio? Isto é desculpa para não fazer o teste? Isto legitima que se torne o preconceito da família o responsável pela maior exposição dos gays à doença, como quer o Globo? Claro que não!
Uma cultura forte é aquela que incentiva os indivíduos, minoritários ou não, a se tornar responsáveis por suas escolhas, vencer seus medos e enfrentar os preconceitos reais ou imaginários da sociedade em torno, em vez de culpar os outros por todos os seus problemas. A verdadeira “discriminação incurável” é a de quem, como a nossa imprensa, trata os membros da “minoria” como vítimas da sociedade, incapazes de encarar um mundo supostamente hostil.
Felipe Moura Brasil ⎯ http://www.veja.com/felipemourabrasil
http://veja.abril.com.br/blog/felipe-moura-brasil/cultura/ate-15-dos-gays-tem-hiv-e-o-globo-culpa-quem-o-preconceito-a-onda-conservadora-e-homofobica-e-mais-uma-blindagem-de-responsabilidade-mais-uma-transferencia/
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EUA: Homens gays são apenas 2% da população, mas 52% das pessoas com HIV. Uma das razões para a maior incidência de infecção é a promiscuidade, segundo CDC
Um novo relatório dos Centros de Controle de Doenças revela que os homens que fazem sexo com outros homens, que representam apenas 2% da população dos EUA, constituem 52% dos americanos com HIV.
O relatório dos CDC observou que 63% das pessoas recentemente infectadas com o HIV também são homens que fazem sexo com outros homens.
“Homossexuais, bissexuais e outros homens que fazem sexo com homens (HSH) representam cerca de 2% da população dos Estados Unidos e, mesmo assim, são o grupo de risco mais afetado pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV)”, diz o relatório dos CDC. “A maioria dos homens homossexuais e bissexuais adquirem o HIV através do sexo anal, que é o tipo mais arriscado de sexo para obter ou transmitir o HIV.”
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Uma das razões para a maior incidência de infecção é a promiscuidade, segundo os CDC.
“Ter mais parceiros sexuais em comparação com outros homens significa que homens homossexuais e bissexuais têm mais oportunidades de ter relações sexuais com alguém que possa transmitir o HIV ou outra doença sexualmente transmissível. Da mesma forma, entre os homens homossexuais, os que têm mais parceiros são mais propensos a adquirir o HIV”, de acordo com os CDC.
(Mais a respeito em inglês – aqui.)
* A palavra gay no título deste post está usada em seu sentido genérico, como o texto evidencia, que abrange homossexuais, bissexuais e outros homens que fazem sexo com homens (HSH).
Sobre o assunto no Brasil, ver por exemplo as matérias da Folha e da Veja.com:
– Casos de Aids entre jovens gays é “preocupante”, diz ministro da Saúde
– Especialistas: aids cresce por país não focar jovens e gays
– Especialistas: aids cresce por país não focar jovens e gays
Felipe Moura Brasil ⎯ http://www.veja.com/felipemourabrasil
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Leia mais: http://extra.globo.com/noticias/saude-e-ciencia/aids-30-anos-depois-do-inicio-da-epidemia-gays-continuam-sendo-os-mais-vulneraveis-14703597.html#ixzz44icB9G8U
Aids: 30 anos depois do início da epidemia, gays
continuam sendo os mais vulneráveis
RIO - “O preço do pecado é a morte.” O estudante Max Goudar, de 24 anos, não conseguia acreditar na frase que ouviu, quando soube que era portador do HIV e cobrou explicações do namorado, com quem crê ter se contaminado. Evangélico praticante, sentiu ainda mais o peso da sentença condenatória.
Mais de 30 anos depois do surgimento da Aids, os homens que fazem sexo com homens continuam sendo a parcela mais vulnerável da população brasileira (e de muitos outros países) à infecção. A prevalência do vírus entre gays é de 10% a 15%, segundo levantamentos, enquanto que, na população em geral, é de 0,6%. Especialistas ouvidos pelo GLOBO são unânimes em afirmar: o preconceito e a discriminação são os maiores responsáveis por essa situação. A recente onda conservadora e homofóbica só faz agravar o problema.
- O preconceito está presente o tempo todo - atesta Max. - A minha antiga igreja, por exemplo, não aceita gays, imagina com HIV.
A diretora do Programa de Aids das Nações Unidas (Unaids) no país, Georgiana Braga-Orillard, confirma que, atualmente, este é o maior desafio para o combate à epidemia.
- O Brasil tem uma resposta muito boa no que diz respeito aos medicamentos disponíveis, mas a discriminação das populações mais vulneráveis continua sendo um desafio - descreve. - Muitas pessoas morrem sem sequer saber que têm a doença. Elas têm medo de fazer o teste, de perder a família, os amigos, o emprego... E acabam chegando muito tarde ao tratamento. Em Curitiba, 20% dos diagnósticos são feitos depois do óbito, para você ter uma ideia.
DIAGNÓSTICO NA DOAÇÃO DE SANGUE
Chefe do Laboratório de Aids da Fiocruz e responsável pelo teste do uso preventivo de drogas do coquetel entre os grupos mais vulneráveis, Beatriz Grinsztejn acredita que o estigma e a discriminação são peças-chave para a vulnerabilidade à infeção.
- Os serviços de saúde, em geral, não são amigáveis - constata Beatriz. - Por isso, o diagnóstico é pior, e o número de mortes é alto. Já imaginou o acesso de uma transexual a um serviço de saúde? Não tem coisa pior.
Por sorte, não foi o que aconteceu com Max. Acostumado a doar sangue, ele tinha sido testado involuntariamente em março de 2012, e seu resultado fora negativo. Em maio, no entanto, ao retornar ao hemocentro, descobriu que era soropositivo. Um teste rápido confirmou o resultado.
- Foi um momento horrível, muito difícil - relembra. - Larguei a faculdade, o emprego, não conseguia fazer nada. Eu sentia tanta raiva, tanto ódio da pessoa (de quem contraiu o vírus) que, se a tivesse encontrado, não estaria falando agora com você. Eu a teria matado e estaria preso. Naquela época, não conseguia entender que eu também tinha responsabilidade pelo que aconteceu.
Felizmente, no entanto, Max também teve grande apoio da mãe, em particular, e da família, em geral, o que nem sempre ocorre. O diagnóstico precoce o levou rapidamente ao tratamento e a uma rede de jovens vivendo com HIV. Ali, teve o acolhimento e as informações de que precisava para se equilibrar emocionalmente e passar a viver com o vírus.
Estudante de Ciências Sociais, ele hoje se dá conta do quão pouco sabia sobre a infecção.
- A informação que eu tinha sobre Aids era a que eu tinha visto no filme do Cazuza - conta. - Não tinha a menor preocupação com isso, achava que era uma coisa completamente distante, algo que só acontecia com travestis, com gente muito promíscua.
Especialistas dizem que, de fato, o conhecimento básico sobre a infecção e suas formas de prevenção não tem chegado às gerações mais jovens, que não viram o início da epidemia, as mortes icônicas de Cazuza e Renato Russo, o sentido de urgência e medo da comunidade médica, a mobilização social das comunidades gays.
- É o que mais escutamos hoje dos mais jovens - diz Georgiana. - A informação não chega. Acho que isso acontece porque estamos usando a mesma mensagem de 30 anos atrás. Há 30 anos, telefone era um bem declarado pelas famílias. Hoje, todo adolescente tem um celular. Precisamos adaptar a mensagem também às faixas etárias e às diferentes regiões do país.
Filmes como “Boa sorte”, de Carolina Jabor, lançado na última quinta-feira, que tem uma soropositiva como protagonista (Deborah Secco, no papel de Judite), podem ser cruciais para a disseminação do que se deve saber sobre a infecção e para alcançar públicos mais amplos, de diferentes faixas etárias e classes sociais. Sem falar, é claro, nas telenovelas.
- A falta de informação leva ao preconceito, discrimina-se o que não se conhece - constata o ator Mateus Solano, de 33 anos, embaixador da boa vontade do Unaids por conta do sucesso de seu personagem Félix na novela das 21h “Amor à vida”, que protagonizou o primeiro beijo entre dois homens na televisão brasileira. - Fazer um personagem capaz de mexer com conceitos e preconceitos, de provocar uma reflexão no público, é muito gratificante. No fim, o beijo foi a pedido do próprio público.
FALTA DE APETITE E ENJOOS
Na opinião de especialistas, a mensagem de que a Aids seria uma espécie de “doença crônica”, controlável com remédios, tinha, originalmente, o objetivo de tentar reduzir o estigma e o pânico que sempre acompanharam a infecção. Fazer com que as pessoas procurassem o diagnóstico, tomassem os remédios, lutassem por uma qualidade de vida melhor. O que as gerações mais novas entenderam, porém, é que a Aids “deixou de ser um problema”.
- Isso está longe de ser verdade - Max sustenta. - Em primeiro lugar, existem os problemas psicológicos. Você descobre que tem uma doença que pode matar. Você perde amigos para a doença. Isso tudo abala muito. Além disso, tem os efeitos colaterais dos remédios. Tem dia em que você está ótimo. Mas tem dia em que não dá para levantar da cama, que você tem diarreia, vomita o dia todo, não consegue comer. Não é tão simples.
Nos dias em que está ótimo, no entanto, Max faz planos para retomar, no ano que vem, o curso de Ciências Sociais. Ele já voltou a trabalhar, trocou de igreja (agora frequenta a Contemporânea, em Niterói, no Grande Rio, onde se aceitam os homossexuais) e, mais importante, começou a namorar novamente. Atualmente, sua maior preocupação é com a festa de Natal que organiza anualmente para crianças carentes de São Gonçalo, também na região metropolitana do Rio. Para a distribuição de brinquedos e elaboração da ceia para pelo menos 1.500 menores, Max está buscando doações pelo site www.jovensrio.org.
- Minha vida mudou completamente. No início, eu achava que era só eu (quem convivia com o HIV). Mas então comecei a olhar em volta. A adaptação levou um tempo. Hoje eu vivo. Quero falar sobre esse assunto para ajudar os outros, para que as pessoas vejam que há um caminho. E quero muito organizar mais uma vez esse Natal Feliz.
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