Mais um capítulo de minha interminável série sobre a ineficiência de sociedades urbanas pós-industriais.
Transportes públicos enfrentam um problema de alocação de recursos razoavelmente simples. Existe uma situação a ser primariamente evitada; indivíduos membros de grupos de necessidades especiais (idosos, gestantes, certas classes de deficientes físicos, pais e mães com crianças de colo, etc) não podem ficar em pé, a não ser que desejem isso explicitamente.
Visando cumprir isso, temos uma quota de assentos prioritários em cada ônibus e vagão de metrô ou trem e dois mecanismos normativos, um legal e outro, moral. O legal assegura, em nome do estado de direito, que podemos literalmente forçar indivíduos que não se enquadrem na categoria supracitada e que estejam ocupando assentos prioritários a se retirarem.
O mecanismo moral é bem mais fraco e consiste em uma rede implícita de incentivos que levam indivíduos a exercerem as virtudes da gentileza e generosidade e delegarem assentos não-prioritários para indivíduos com necessidades especiais.
Assentos prioritários não são proibidos de serem ocupados por passageiros comuns desde que a condição de que nenhum passageiro de necessidades especiais fique involuntariamente em pé seja satisfeita. Isso pode sedimentar a seguinte norma, dependendo da civilidade do ambiente urbano; ninguém senta nos assentos prioritários para evitar constrangimentos e assegurar a rápida disponibilidade para potenciais portadores de necessidades especiais.
Ocorre que esse sistema impõe fardos não apenas ao passageiro comum mas também aos portadores de necessidades especiais e a falta de reforço dessas obrigações torna o sistema ineficiente.
É relativamente comum eu vislumbrar a seguinte situação aqui no metrô carioca: os passageiros existentes portadores de necessidades especiais decidem ocupar assentos não-prioritários (eu conjecturo que alguns idosos preferem fazê-lo por vaidade) e assentos não-prioritários acabam por default não sendo ocupados por ninguém, gerando vagas ociosas.
Para o sistema funcionar, é mister que os passageiros de necessidades especiais ocupem primeiro as vagas prioritárias. Na situação destas já estarem legitimamente ocupadas, a responsabilidade cai para a generosidade e civismo do resto dos passageiros.
Esse cenário é generalizável para outros loci de ineficiência urbana que obedecem a regras análogas - como filas de bancos e supermercados.
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